Quando o sol ainda não havia cessado o brilho,
quando a tarde engolia aos poucos as cores do dia
e despejava sobre a terra os primeiros retalhos de sombra,
eu vi que Deus veio assentar-se perto do fogão da minha casa.
Chegou sem alarde, retirou o chapéu da cabeça
e buscou um copo de água no pote de barro
que ficava num lugar de sombra constante.
Ele tinha feições de homem feliz, realizado,
parecia imerso na alegria que é própria
de quem cumpriu a sina do dia e que agora
recolhe a alegria cotidiana que lhe cabe.
Eu olhava e pensava:
'Como é bom ter Deus dentro de casa!
Como é bom viver essa hora da vida
em que tenho direito de ter um Deus só pra mim'.
Cair nos seus braços, bagunçar-lhe os cabelos,
puxar a caneta do seu bolso
e pedir que ele desenhasse um relógio
bem bonito no meu braço.
Mas aquele homem não era Deus;
aquele homem era o meu pai,
e foi assim que descobri que meu pai,
com seu jeito finito de ser Deus,
revelava-me Deus com seu jeito de ser homem.
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