Despertou-me a atenção uma cena do cotidiano numa rua do Bairro da Paróquia onde exerço o meu ministério. Era cedo, de manhã. Dois amigos caminhavam com uma garrafa, cada um em sua mão. Cheguei perto e percebi que um tinha a garrafa vazia e o outro cheia. Não imaginava qual seria o seu conteúdo. Ouvindo a conversa fiquei curioso e me aproximei ainda mais. Um lamentava que não tinha mais cachaça para passar o dia. O outro, manifestando-se solidário, logo se prontificou em partilhar a metade da que tinha em sua garrafa.
Na medida em que andavam, iam tomando seus goles que os alegrava. Por coincidir o caminho deles com o meu, ouvi que um comentava com o outro: “Eu preciso tomar! Já estou acostumado! Afinal, é minha única diversão. E ainda mais, eu não tenho carro, não dirijo e o bafômetro não me atinge, posso beber”. O amigo e companheiro também confirmou a mesma sorte.
“Não dirijo! Posso beber!” Seguindo o caminho ia pensando na cena, nas palavras e nas duas criaturas que andavam sem rumo. Não dirigir carro não é problema algum. Tanta gente bem-sucedida na vida não dirige. Tantas pessoas responsáveis e realizadas não têm carro e não dirigem. Até há gente que tem carros de última geração e não dirige.
O pior que possa acontecer para uma pessoa é deixar o volante da vida nas mãos de qualquer um, ou da cachaça, da droga ou da alienação. Deus nos concedeu o dom da liberdade para que aprendamos a dirigir a vida com sujeitos responsáveis e não como objetos à deriva, desprovidos de rumos e ideais.
Ao pensar nos dois amigos que encontrei no caminho, um deles de uns trinta anos e outro de uns quarenta, imaginei o potencial de dons que estaria dentro deles. O que estavam fazendo de suas vidas e o que poderiam fazer. É verdadeira aquela história dos jovens que foram consultar um sábio para apanhá-lo em contradição. Cada um levava um pássaro na mão. Combinaram em perguntar ao sábio como estaria o pássaro. Caso dissesse que estaria vivo, apertariam as mãos e o matariam. Caso dissesse que estaria morto, abririam a mão e o soltariam com vida.
Com a armadilha pronta, chegaram ao velho sábio e o encontraram sorridente e aberto para o diálogo. Logo perguntaram: “Como está o pássaro em nossa mão?” O velho olhou com carinho para os jovens e logo lhes disse: “O pássaro está como vós quereis que esteja!”
Encantados com a sabedoria o abraçaram, mas o sábio logo fez a aplicação da cena simbólica dizendo: “Meus jovens, a nossa vida está em nossas mãos. Deus no-la deu e dela nos fez responsáveis. A cada dia a vida está como nós queremos”.
É claro que tantas vezes somos atingidos por situações e condicionamentos que nos prejudicam e até nos imobilizam por um tempo. Porém é sempre necessário resgatar a capacidade de dirigir a vida, assumindo o volante, sem nos deixar levar de carona, ou então movidos a álcool sem futuro, atrofiando um potencial de vida que Deus colocou em nós para sermos construtores de um mundo melhor.
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